quinta-feira, 31 de março de 2011

Goya - II

A condessa de Chinchón


Cerca de 1798 e a pedido de Manuel Godoy, primeiro-ministro espanhol, pinta o seu célebre quadro “A Maja Desnuda” retratando possivelmente a amante deste, Pepita Tudo, uma bonita actriz, o que lhe trará mais tarde problemas com a Inquisição, que o considerou imoral e obsceno. O tema da nudez não era bem aceite por uma sociedade extremamente conservadora como a da Espanha, naquela altura, e levá-lo-á mais tarde a responder perante a Inquisição (1815).

Os seus retratos deste período mostram, todavia, a sua fascinação pelas mulheres e pelas crianças, não igualada por nenhum outro artista, com a possível excepção de Renoir. Dois retratos de mulheres, executados nessa época, mostram claramente essa qualidade: "Doña Antonia Zarate", orgulhosa, erecta, coquete e algo triste; e a "Condessa de Chinchón", o mais terno dos seus retratos de mulheres.

Datado de 1800, o retrato da Condessa de Chinchón, esposa de Godoy, mostra-a sozinha numa sala, com um vestido branco que acentua a sua expressão inocente e melancólica, espigas de trigo adornando os cabelos como referência à sua próxima maternidade (Maria Teresa encontra-se grávida de cinco meses), numa tela em fundo escuro, sem mais nenhum elemento decorativo, os ombros algo descaídos acentuando a sua fragilidade, e com as mãos como que afagando o ventre que o pintor ilumina com uma luz branca.

Como consequência da Revolução Francesa, Napoleão Bonaparte assume o poder, e a Europa entra em guerra. De 1808 a 1814, Goya assiste aos horrores da Guerra Peninsular, quando as tropas francesas entram em Espanha destituindo o rei e pondo no trono o seu irmão José Bonaparte. Algumas das suas pinturas mais dramáticas, como o “2 de Maio ou A Carga dos Mamelucos” e o célebre “Os Fuzilamentos de 3 de Maio” retratam este período, assim como os da terrível fome que grassou entre 1811 e 1812. É também neste ano que morre a sua esposa Josefa, que sempre o acompanhou. No ano seguinte, a sua governanta, Leocádia Weiss, uma mulher muito mais jovem e bonita, mãe de duas crianças, e de cujo marido se divorciará, dá à luz uma menina, que é geralmente considerada como filha do pintor.

Durante a ocupação francesa pinta também retratos de nobres franceses, incluindo o de José Bonaparte, o que provoca um certo desconforto quando os franceses abandonam Espanha. Trabalha entretanto numa série de 85 estampas que intitula “Os Desastres da Guerra”, onde mostra cenas brutais de uma guerra extremamente violenta e cruel, algumas delas testemunhadas por ele mesmo. Depois da retirada das tropas inimigas, e instalado um governo liberal que tenta várias reformas, entre elas a da Igreja, pinta uma série de desenhos e gravuras retratando os vícios do clero, onde denuncia também os abusos da Inquisição e as torturas praticadas.

Em 1819, já com 73 anos, compra uma casa numa zona rural perto de Madrid, conhecida como a Quinta del Sordo, onde se instala com Leocádia e as crianças, para fugir um pouco ao escândalo desta ligação, contraindo nesse inverno, uma doença que o coloca às portas da morte. É a partir daí, consciente da sua debilidade física, que começa a pintar as paredes da casa com grandes composições a óleo, as famosas “Pinturas Negras”, (assim chamadas por a cor escura ser uma predominante), uma crítica impiedosa e dramática à religião, à velhice, à doença e à morte, assim com à instabilidade política vivida nesse período em Espanha, e que serão passadas para a tela em 1873, já depois do falecimento do pintor. É também nesta altura que se estreia na litografia, fazendo mais tarde uma série intitulada “Os Touros de Bordéus”, que são publicadas em 1825.

No seu regresso ao trono, o rei de Espanha, Fernando VII, institui um regime absolutista, e Goya com receio que os seus quadros o pudessem incriminar, pede em 1823 licença ao rei para se deslocar a França, a fim de se poder tratar, o que lhe é concedido. Desloca-se para casa de um amigo, em Bordéus, onde fica a residir, voltando a Madrid em 1826, apenas para pedir ao rei que lhe conceda a reforma e o autorize a continuar em França.

Mesmo no seu auto-exílio continua a trabalhar, dedicando-se também à miniatura sobre marfim, pintada a guache. As suas últimas obras são um retrato de José Pio de Molina e a famosa “A Bela Leiteira”, pintadas cerca de 1827. Este quadro pode ser considerado como “o canto do cisne” de um grande artista da beleza feminina. Em 1828, já muito doente, fica sem fala e meio paralisado, falecendo pouco depois, a 15 de Abril, com 82 anos de idade. Ficou sepultado no cemitério de Bordéus, sendo os seus restos mortais transladados para Espanha, para a Capela de Santo António de la Florida, (a pintura da cúpula, Um Milagre de Santo António de Pádua, foi feita por Goya em 1798), constatando-se nessa altura, que a cabeça do pintor não vinha com o corpo.


O sabbath das bruxas

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