quinta-feira, 5 de maio de 2011

O Desacato de Santa Engrácia


A Maldição de Simon Solis

O Desacato de Santa Engrácia encontra fundamento nos relatos históricos da paróquia de Santa Engrácia, em cujos anais ficou registado um incidente ocorrido na noite de 15 de Janeiro do ano de 1630.
“Lisboa preparava-se em grandes festejos para celebrar o nascimento do príncipe herdeiro que receberia o nome de Baltazar Carlos e que era filho de Filipe IV de Espanha e III de Portugal. Foi nesse ambiente que se propagava a notícia do roubo das relíquias da igreja de Santa Engrácia, que ficava perto do Convento de Santa Clara.
Incrível a comoção que causou este atroz sacrilégio, lançando-se logo pregões que nenhuma pessoa, sem nova ordem, saísse de sua casa e sem dilação decorreram por toda a cidade os ministros da justiça inquirindo com exactas diligências, que pessoas haviam saído fora na noite precedente e em que haviam estado. Achou-se que um homem ordinário, chamado Simão Pires Solis, havia estado fora e sendo perguntado onde, não respondeu a propósito, antes com grande turbação; ajuntaram-se outros indícios que caíram sobre ser homem turbulento e cristão-novo e por eles foi condenado a ser queimado vivo, cortando-lhe primeiro as mãos. A muitos pareceu acelerada e rigorosa esta sentença visto que não havia prova concludente, nem confissão do reo, mas, todavia, se executou na forma sobredita.”
Simão Solis nunca confessou o crime de que o acusavam, embora tivesse sido com toda a certeza, sujeito a tratos durante o interrogatório; antes proclamou sempre a sua inocência, sem no entanto revelar o que tinha feito naquela noite.
Soube-se depois, que Simão nessa noite rondava o Convento de Santa Clara para namorar uma religiosa chamada Violante, encerrada no convento pelo pai fidalgo, que não aceitava aquele amor. Para a não comprometer, o seu enamorado preferiu aceitar uma morte horrível.
Efectivamente, a 3 de Fevereiro de 1631, Simão foi conduzido em procissão ao Campo de Santa Clara, onde no próprio lugar do crime lhe foram decepadas ambas as mãos, sendo depois queimado vivo.
Como quem conta um conto, acrescenta um ponto, logo a imaginação popular fortemente emocionada tanto pelo roubo como pela execução, passou a misturar ficção e realidade, e assim diz-se que a caminho do suplício, o jovem Simão gritou: “Tão certo é eu estar inocente que as obras de Santa Engrácia nunca mais terminarão”.
Anos mais tarde, a freira Violante foi chamada a assistir aos últimos momentos de um ladrão que tinha pedido a sua presença. Revelou-lhe que tinha sido ele a roubar as relíquias e sabendo da relação secreta dos jovens, tinha incriminado Simão. Pedia-lhe pois que o perdoasse para poder morrer em paz.
Por maldição ou por uma série de azares, o Panteão de Santa Engrácia demorou cerca de 334 anos para ser concluído…

2 comentários:

  1. Conhecia a história, mas é sempre agradável recordar e ver divulgados pedaços da nossa História.

    ResponderEliminar