segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

A Jovem Esquartejada – II




…Quando um jovem, saindo da multidão, avançou para o vizir e assim lhe falou:
“Ó refúgio dos pobres, tu serás salvo na tua aflição, porque fui eu quem matou a mulher encontrada no cofre. Que me crucifiquem, pois, e que a justiça siga o seu curso”.
E ao califa, contou a sua história: “ Sabei senhor, que esta mulher era a minha esposa e mãe dos meus filhos. Amava-me e servia-me com dedicação. Um dia, caiu doente e pediu-me maçãs para comer (fruto muito raro em Bagdade). Levei-lhe 3 destes frutos e, encontrava-me na minha loja a atender os fregueses, quando vi passar um escravo negro atirando uma das maçãs ao ar. Perguntei-lhe onde a tinha arranjado e ele respondeu-me a rir: “Deu-ma a minha senhora. Havia muito tempo que a não via e quando voltei a encontrá-la, estava na cama doente e tinha 3 maçãs junto dela. E disse-me: O cornudo do meu marido teve muito trabalho para me arranjar estas maçãs. Comi e bebi com ela e, trouxe uma das três maçãs”.
Quando ouvi isto, ó comendador dos crentes, vi tudo escuro à minha frente. Fechei a loja e corri a casa, cego de cólera. Entrei no quarto, e, quando vi apenas duas maçãs, perguntei a minha mulher pela terceira. Cansada, ela respondeu que não sabia. Isto foi para mim a prova de que o escravo dissera a verdade. Agarrei numa faca, coloquei-me atrás dela e cortei-lhe a garganta. Depois cortei o seu corpo em pedaços, que guardei num cofre, atirando-o ao Tigre. Quando cheguei a casa, encontrei o meu filho mais velho a chorar.
- Porque choras tu rapaz? Perguntei-lhe
- Porque tirei uma das maçãs que a mãe tinha ao pé dela e levei-a para a rua para brincar com os meus irmãos. Então apareceu um escravo negro que ma tirou, perguntando-me onde a tinha arranjado. Respondi que o meu pai tinha tido muito trabalho para arranjar três maças para a minha mãe que estava doente, e pedi-lhe que ma devolvesse, mas ele empurrou-me e fugiu… Como tinha medo que a mãe me ralhasse, só agora voltei para casa.
Quando acabei de ouvir o meu filho, vi que aquele vil escravo tinha caluniado ignobilmente a minha mulher e que eu a tinha morto injustamente. Há quatro dias que a choro dia e noite, peço-te que me mandes executar imediatamente, porque não lhe quero sobreviver”.
Por Alá! – exclamou o califa – Que este jovem seja perdoado e encontrem-me esse maldito escravo…
Voltando-se para o vizir, deu-lhe novamente três dias para o encontrar, senão seria ele a morrer.
O pobre Giafar pensava com os seus botões: “Já por duas vezes fui ameaçado de morte – tantas vezes vai o cântaro à fonte, que um dia quebra!”.
Na manhã do quarto dia, o vizir preparou-se para morrer; fez testamento e despediu-se da família. Ao abraçar a mais nova das suas filhas, sentiu qualquer coisa redonda na algibeira, e perguntou-lhe: “Filhinha, que tens aqui?” “Ó pai, é uma maçã que me deu há quatro dias o nosso escravo Rihan” respondeu a garota.
Este foi imediatamente agarrado e interrogado, confessando que roubara a maçã a uma criança, numa ruela. Giafar não cabia em si de espanto ao ver surgirem todas estas complicações que haviam causado a morte da jovem, por culpa de um escravo seu. Depois regozijou-se por ele próprio ter escapado de uma morte certa e recitou estes versos:
“Se os teus males são por culpa do teu escravo, porque não pensas em desembaraçar-te dele?
Não sabes que os escravos pululam, mas que a tua alma é apenas uma e não pode ser substituída?”
Mas reconsiderando, levou o escravo consigo á presença do califa, a quem contou a história.
E Harun ficou tão maravilhado, que a mandou registar nos anais, para servir de lição aos vindouros. Deu ao jovem viúvo uma das suas escravas e, quanto ao escravo, a pedido do vizir acabou por lhe perdoar o seu acto insensato…
Fontes: adaptação de um conto de “O Livro das Mil e Uma Noites”

domingo, 30 de janeiro de 2011

Contos árabes - II


História da Jovem Esquartejada - I

Harun-al-Raschid (aquele que segue um caminho recto), o célebre califa de Bagdade, tinha o costume de deambular pelas ruas da cidade acompanhado pelo seu fiel vizir, Giafar Al-Barmaki, para conhecer as necessidades dos seus súbditos e melhor poder administrar a justiça.
Ora numa destas noites, passando eles por uma rua miserável, encontraram um velho pescador, que lamentava tristemente a sua sorte:
“Na verdade, que pode ser mais desolador do que o pobre, o estado do pobre, o pão do pobre e a sua vida?
Se é Verão, esgota as forças; se é Inverno, só cinzas tem para se aquecer.
Se se detém, para o escorraçar os cães se precipitam. É um miserável ser, objecto de ofensas e de escárnio. Oh! Quem há por aí que mais miserável seja?
Se não for ele a gritar a sua queixa e a mostrar a sua miséria, quem a lastimará?
Oh! Se é esta a vida do pobre, quem me dera morrer!”.
Quando lhe perguntaram a causa dos seus lamentos, o velho respondeu que tinha trabalhado todo o dia, mas como nada tinha conseguido pescar, não tinha com que sustentar a família. Então o califa disse-lhe para voltar a deitar as redes, que o que quer que nelas viesse, ele lho compraria por cem moedas de ouro.
Satisfeito, o pescador lançou de novo as redes ao rio e quando as puxou encontrou nelas um pesado cofre selado. O califa mandou abrir o cofre e, lá dentro, encontrava-se o corpo de uma linda adolescente, morta e cortada em pedaços. Indignado, Harun-al-Raschid gritou para o seu vizir:
“Que desgraça! Malvado vizir, será necessário que, no meu império, as pessoas sejam assassinadas e lançadas ao rio para que, no dia do Juízo, eu pague por estes factos? Por Alá! esta mulher será vingada e o seu assassino sofrerá a morte mais cruel!”. E acrescentou: “Mandar-te-ei crucificar á porta do meu palácio, a ti e a quarenta membros da tua família, se não me trouxeres o assassino desta mulher para que lhe seja aplicado o seu justo castigo”.
Giafar pediu três dias de prazo para o cumprimento desta missão, mas, como não conseguisse encontrar o criminoso, ao quarto dia apresentou-se ao califa, que mandou apregoar a sua morte por toda a cidade.
Já se encontravam junto ao patíbulo, aguardando o carrasco o sinal do califa para proceder à execução…

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

As invasões árabes


Faz este ano de 2011, exactamente 13 séculos que o berbere Tariq Ibn Zeyad, mais conhecido por Tarique, atravessou à frente de um exército de 7000 homens o estreito que separa os dois continentes, desembarcando no rochedo que desde então tem o seu nome (Gibraltar: Djebel al Tarik = montanha de Tárique), dando início a 800 anos de domínio árabe na Península Ibérica, a que deram o nome de Al-Andaluz.
Mas isto só foi possível, devido às dissenções existentes no seio do império visigótico, também eles invasores e que após um domínio de três séculos na Península, já não conseguiam dominar as divisões internas que o minavam.
Com o andar dos tempos, os Visigodos tinham acabado por se integrar na população romana até formarem um povo de raiz românica, o povo hispânico, que falava línguas ou dialectos originários do latim. Mas, internamente, o Império Visigodo estava dividido. Os reis eram joguetes nas mãos dos aristocratas ávidos de poder e a fanática intolerância dos sacerdotes hispânicos tornava a vida impossível a quem não tinha a mesma fé. Os numerosos judeus e os camponeses oprimidos receberam os Árabes e os Mouros como libertadores, ajudando-os a apoderarem-se das povoações.
Quando os dois exércitos se defrontaram na batalha de Guadalete, os godos foram completamente desbaratados e o seu último rei, Rodrigo, parece ter morrido na batalha ou durante a fuga. Apenas um punhado de homens sobreviveu, procurando refúgio nas montanhas das Astúrias, onde fundaram um pequeno reino.
Em seguida, tornou-se relativamente fácil aos Árabes conquistarem o resto da Península, mas em 720, atraídos pelos tesouros das igrejas galo-romanas atravessaram os Pirinéus, assaltando o reino dos Francos, mas Carlos Martel, em 732, na batalha de Poitiers, acabou definitivamente com o seu avanço na Europa.
Os poucos godos que sobreviveram e se refugiaram nas Astúrias, comandados por Pelágio, deram início a uma série de ataques, a que hoje chamaríamos uma “guerra de guerrilhas”, e que, culminando na batalha de Covadonga, em 722, marcou o início do longo processo de retomada do território ocupado, ao qual se deu o nome de Reconquista, que atravessando toda a Idade Média, só terminou em 1492, com a conquista do reino de Granada, pelos Reis Católicos, Fernando e Isabel, o que levou à expulsão definitiva dos muçulmanos.
Mas quem foram estes visigodos e estes árabes, que constituem, afinal, como diz Herculano, as fontes da nossa civilização?
Temos o ano inteiro para o descobrir…

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

A Bétula



Também chamada de vidoeiro, a bétula é uma árvore muito vulgar nas florestas setentrionais tanto do Velho como do Novo Mundo. Após a recessão dos glaciares plistocénicos, foi ela juntamente com o freixo, a primeira a reflorestar o continente euro-asiático, pelo que em todas as línguas indo-europeias existe um termo para a designar.
Tanto a principal espécie europeia, a bétula verrucosa como a bétula macia, têm propriedades medicinais, conhecidas desde a Antiguidade, mas foi Santa Hildegarda de Bingen (verão de 1098-17 de Setembro de 1179), monja beneditina, naturalista, médica informal, e mestra do Mosteiro de Rupertsberg em Bingen am Rhein, na Alemanha, que chamou a atenção para os efeitos cicatrizantes das suas folhas.
A seiva é recolhida na Primavera e as folhas e a casca apanham-se na Primavera e no Outono, sendo depois secas à temperatura ambiente. Os povos antigos da Eurásia costumavam mascar casca de bétula para afastar o mau hálito. O chá das folhas é bom para cálculos renais, inflamações na bexiga, e as folhas também se empregam nos tónicos sazonais para a gota e reumatismo.
O chá também é bom para a lavagem do couro cabeludo a fim de eliminar a caspa e a queda do cabelo. A seiva, que é adocicada e rica em vitamina C, pode ser destilada, fabricando-se uma cerveja de sabor agradável e tonificante. O aromático óleo de bétula contém o mesmo ácido acetilsalicílico da aspirina, eficaz contra o reumatismo, sendo usado também, na fabricação de sabonetes medicinais.
O seu tronco fibroso descasca-se em lâminas tão finas como papel e com o carvão que produz, fabricam-se lápis de desenho.
O seu nome provém da palavra alemã “bircha”, que quer dizer branco luminoso. Nos países nórdicos os seus troncos brancos iluminam as noites longas e escuras do Inverno, pelo que é considerada sagrada.
Na mitologia nórdica, é a árvore consagrada ao deus Thor, o deus germânico da trovoada, e representa a chegada da Primavera e da fertilidade. Na Alemanha medieval, os conselhos distritais reuniam-se nos bosques de bétulas.
Até há pouco tempo, nalgumas regiões da Europa era costuma plantá-las à frente das casas para as proteger dos relâmpagos, e queimavam-se folhas nos estábulos para que o fumo afugentasse pragas e feitiços. A primeira vez que se levava o gado para as pastagens da Primavera, batia-se-lhe com varas de vidoeiro para lhes assegurar saúde e fertilidade.
Os fasces, emblema da magistratura romana, eram feitos de ramos de bétula.
Na Finlândia usam-se ramos de vidoeiro nos rituais dos banhos a vapor, e também para provocar a transpiração.
As bétulas muito antigas eram consideradas moradas de duendes e para o povo iacute da Sibéria davam acesso a um espírito terrestre belo e benfazejo. O lenhador lapão tinha de informar a árvore de que ia cortá-la, para que os espíritos que a habitavam tivessem tempo de se mudar, mas algumas eram consideradas tão sagradas que ninguém as podia abater.

Fontes: wikipedia.org
Lipp, Frank J. – O Simbolismo das Plantas.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Romanceiro Português

A morte de D. Beltrão

Quedos, quedos, cavaleiros, que el-rei os manda contar!
Contaram e recontaram, só um lhe vinha a faltar:
Era esse Dom Beltrão, tão forte no batalhar.
Nunca o acharam de menos senão naquele contar,
Senão ao passar do rio, nos portos do mal passar.
Deitam sortes à ventura a qual o havia de ir buscar,
Que, ao partir, fizeram todos preito homenagem no altar,
O que na guerra morresse dentro em França se enterrar.
Sete vezes deitam sortes a quem no há-de ir buscar;
Todas sete lhe caíram ao bom velho do seu pai.
Volta rédeas ao cavalo, sem mais dizer nem falar…
Que lh’ a sorte não caíra, nunca ele havia de ficar.
Triste e só se foi andando, não cessava de chorar.
De dia vai pelos montes, de noite vai pelo vale;
Aos pastores perguntando se viram ali passar
Cavaleiro de armas brancas, seu cavalo tremedal.
-Cavaleiro de armas brancas, seu cavalo tremedal,
Por esta ribeira fora ninguém não no viu passar.
Vai andando, vai andando, sem nunca desanimar,
Chega àquela mortandade donde fora Roncesval;
Os braços já tem cansados de tanto morto virar;
Viu a todos os franceses, Dom Beltrão não pode achar.
Volta atrás o velho triste, voltou por um areal,
Viu estar um perro moiro, em um adarve a velar.
-Por Deus te rogo, bom moiro, me digas sem me enganar,
Cavaleiro de armas brancas se o viste por ‘qui passar,
Ontem à noite seria, hora do galo cantar.
Se entre vós está cativo, a oiro o hei-de pesar.
-Esse cavaleiro, amigo, diz-me tu que sinais traz.
-Brancas são as suas armas, o cavalo tremedal,
Na ponta de sua lança levava um branco sendal,
Que lho bordou sua dama, bordado a ponto real.
-Esse cavaleiro, amigo, morto está nesse pragal,
Com as pernas dentro d’ água, o corpo no areal.
Sete feridas no peito a qual será mais mortal:
Por uma lhe entra o sol, por outra lhe entra o luar,
Pela mais pequena delas um gavião a voar.
-Não torno a culpa ao meu filho, nem aos moiros de o matar;
Torno a culpa ao seu cavalo de o não saber retirar.
Milagre! Quem tal diria, quem tal poderá contar!
O cavalo meio morto ali se pôs a falar:
-Não me tornes essa culpa, que ma não podes tornar:
Três vezes o retirei, três vezes para o salvar.
Três me deu de espora e rédea c’o a sanha do pelejar.
Três vezes me apertou cilhas, me alargou o peitoral…
À terceira fui a terra desta ferida mortal.


Fonte: Romanceiro Português da Tradição Oral Moderna – Vol. I, Fundação Calouste Gulbenkian
Versão de Trás-os-Montes e Alto Douro

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

A Lenda das Rosas Vermelhas



Diz uma lenda árabe que, em tempos, todas as rosas eram brancas…Uma noite de Primavera, sob uma Lua Minguante, um rouxinol pousou sobre uma esbelta rosa de uma brancura imaculada e ficou imediatamente apaixonado. Até esse dia, nunca se ouvira um rouxinol cantar, viviam toda a sua vida em silêncio, mas o amor deste por aquela rosa tão especial, era de tal maneira forte, que uma canção de uma beleza espantosa se formou na sua garganta e ele abriu as asas em torno da flor, num abraço apaixonado. Apertou-a com tal paixão, que os espinhos dela o feriram profundamente.
Mesmo assim, o rouxinol não afrouxou o seu amplexo, continuando o seu canto de amor, cheio de maravilhosos trinados, até que, já exangue, o pobre apaixonado tombou sem vida. O sangue que lhe corria das feridas caiu sobre as pétalas brancas da rosa, manchando-as.
E desde então, há rosas que nascem vermelhas… e na Primavera, pela noite dentro, ouvem-se os trinados dos rouxinóis cantando as suas canções de amor!

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Miguel Torga


«Ser livre é um imperativo que não passa pela definição de nenhum estatuto. Não é um dote, é um Dom». Miguel Torga

Pseudónimo do grande escritor e poeta Adolfo Correia da Rocha, nasceu a 12 de Agosto de 1907, em S. Martinho de Anta, no concelho de Sabrosa, em Vila Real, Trás-os-Montes, filho de Francisco Correia da Rocha e de Maria da Conceição Barros, de quem ele diria mais tarde “ser a mais eterna das mulheres”.
Como filho de camponeses (Nasci como um cabrito/Ou como um pé de milho…), teve uma infância rural dura, que lhe deu a conhecer a realidade do campo, feita de árduo trabalho contínuo, como acontecia a tantos outros garotos como ele. Feita a quarta classe com distinção, o pai reconhecendo-lhe a inteligência, tira-o da enxada e envia-o para o seminário de Lamego, onde esteve pouco tempo. Sobre esta ida escreverá mais tarde, num dos volumes de “A Criação do Mundo”: “Ia na frente, de fato preto, montado, a segurar o baú de roupa que levava diante de mim. Meu pai e minha mãe vinham atrás, a pé, ele com os ferros da cama às costas e ela de colchão e cobertores à cabeça".
Aos treze emigrou para o Brasil, onde trabalhou durante cinco anos na fazenda de um tio, em Minas Gerais, que embora lhe desse trabalhos duros para fazer, apanhador de café, vaqueiro, tratador dos porcos, varredor, etc., o pôs depois a estudar no Liceu de Leopoldina. Porém a tia era tão má, que se viu forçado a regressar a Portugal em 1925, garantindo-lhe o tio que lhe pagaria a formatura. Em dois anos conclui os estudos liceais e em 1928, entra para a Universidade de Coimbra, finalizando em 1933 o curso de Medicina. Bastante crítico da “praxe” e de outras manifestações académicas, chama “farda” à capa e batina, tem um feitio socialmente difícil, reservado e pouco comunicativo.
Exerceu a profissão de médico em S. Martinho de Anta e outras localidades, chegando a ter consultório em Leiria, mas acaba por se fixar definitivamente em Coimbra, como otorrinolaringologista em 1941. Em 1940 casou com Andrée Cabbré, uma estudante belga, aluna de Estudos Portugueses com Vitorino Nemésio, em Bruxelas, e que tinha vindo fazer um curso de Verão à Universidade de Coimbra. “Vou tentar ser um bom marido, cumpridor. Mas quero que saibas, enquanto é tempo, que em todas as circunstâncias te trocarei por um verso”, confessa ele em “A Criação do Mundo, V”. Em 1955 nasce-lhe a sua única filha.
A sua oposição ao Estado Novo e a sua denúncia dos crimes da guerra civil espanhola valeram-lhe algumas vezes a prisão pela polícia do Estado ou a apreensão do seu passaporte, sendo a sua esposa proibida de leccionar em Portugal. Os seus livros foram sempre edições de autor, em papel barato, não só porque se recusava a entregá-los previamente à Censura, como era obrigação na altura, o que lhe valeu algumas apreensões (como aconteceu com “Os Contos da Montanha), mas também porque, como até os amigos reconheciam, ele era extremamente económico. No entanto, como médico, dava consultas gratuitas aos seus doentes mais pobres e diziam que era um homem de bom coração.
Estreou-se nas letras em 1928, quando entra para a Universidade, com Ansiedade, um livro de versos. Seguiu-se Rampa (1930), e Abismo (1932). Em 1934 publica o ensaio “A Terceira Voz”, onde aparece pela primeira vez com o pseudónimo que adoptará e pelo qual é mundialmente conhecido: Miguel Torga. Quando lhe perguntam a razão, explica: “Porque eu sou quem sou. Torga é uma planta transmontana, urze campestre, cor de vinho, com as raízes muito agarradas e duras, metidas na terra, como eu sou duro e tenho raízes. Miguel é um nome ibérico… Uma homenagem a duas grandes figuras espanholas: Miguel Unamuno, e Miguel de Cervantes”.
Seguiu-se A Criação do Mundo (1937), uma serie de 6 volumes de autobiografia ficcionada. Em 1941 começa a escrever o primeiro dos dezasseis volumes de “Diário”, onde reúne um vasto conjunto dos seus poemas. Em 1943 apareceu a obra O Senhor Ventura, um livro de contos rústicos, adaptado mais tarde ao cinema. Em 1954, rejeita o “Prémio Almeida Garrett”. Em 1960 é proposto para o Prémio Nobel da Literatura, sendo a proposta renovada em 1978, mas embora fosse inteiramente merecido, nunca lhe foi atribuído. Recebe o “Prémio Literário Diário de Notícias” em 1969. É galardoado em 1976, com o “Prémio Internacional de Poesia”, na XII Bienal de Poesia, da Bélgica e, em 1978 a Fundação Calouste Gulbenkian homenageia-o pelos seus 50 anos de carreira literária. Em 1980 recebeu o Prémio Morgado de Mateus, ex-equo com Carlos Drumond de Andrade, em 1989 é-lhe atribuído o “Prémio Camões”, e em 1992, é distinguido com o “Prémio da Vida Literária”. Em 1993, já doente, termina o último dos seus “Diário”, onde escreve o poema que abaixo se reproduz: “Requiem por mim”.
A sua ligação à terra, à região natal e a Portugal, à própria Península Ibérica e às suas gentes, é uma constante dos textos do autor. Tendo como homem a experiência dos sofrimentos da vida rural, da emigração, do contacto com as misérias e a morte, tornou-se o poeta do mundo rural, das forças telúricas, ancestrais, que animam o instinto humano na sua luta dramática contra as leis que o aprisionam.
Para Miguel Torga, nenhum deus é digno de louvor: na sua condição omnisciente é-lhe muito fácil ser virtuoso, e enquanto ser sobrenatural não se lhe opõe qualquer dificuldade para fazer a Natureza - mas o homem, limitado, finito, condicionado, exposto à doença, à miséria, à desgraça e à morte é também capaz de criar, e é sobretudo capaz de se impor à Natureza, como os trabalhadores rurais trasmontanos impuseram a sua vontade de semear a terra aos penedos bravios das serras:

Hinos aos deuses, não.
Os homens é que merecem
Que se lhes cante a virtude,
Bichos que cavam no chão,
Actuam como parecem
Sem um disfarce que os mude.


Pensa algumas vezes em sair de Portugal “Mas abandonar a Pátria com um saco às costas? Para poder partir teria de meter no bornal o Marão, o Douro, o Mondego, a luz de Coimbra, a biblioteca e as vogais da língua…”. Nunca se filiou em nenhum partido: “O meu partido é o mapa de Portugal”.
Autor de mais de 50 obras publicadas, exímio contista, romancista, ensaísta, e dramaturgo, os seus livros estão traduzidos para a generalidade dos idiomas europeus, assim como para chinês e japonês
Faleceu em 17 de Janeiro de 1995, no Instituto de Oncologia de Coimbra. Foi sepultado na sua aldeia, em S.Martinho de Anta, em campa rasa, junto da qual floresce uma torga.


REQUIEM POR MIM

Aproxima-se o fim
E tenho pena de acabar assim,
Em vez da natureza consumada,
Ruína humana.
Inválido do corpo
E tolhido da alma.
Morto em todos os órgãos e sentidos,
Longo foi o caminho e desmedidos
Os sonhos que nele tive.
Mas ninguém vive
Contra as leis do destino.
E o destino não quis
Que eu me cumprisse como porfiei,
E caísse de pé, num desafio.
Rio feliz a ir de encontro ao mar
Desaguar,
E, em largo oceano, eternizar
O seu esplendor torrencial de rio.

Miguel Torga.



Obras publicadas
Poesia: Ansiedade, 1928 – Rampa, 1930 – O outro livro de Job, 1936 – Lamentação, 1943 – Nihil Sibi, 1948 – Cântico do Homem, 1950 – Alguns Poemas Ibéricos, 1952 – Penas do Purgatório, 1954 – Orfeu Rebelde, 1958.
Prosa: Pão Ázimo, 1931 - Criação do Mundo, Os Dois Primeiros Dias, 1937, - O Terceiro Dia da Criação do Mundo, 1938 – O Quarto Dia da Criação do Mundo, 1939 – O Quinto Dia da Criação do Mundo, 1974 – O Sexto Dia da Criação do Mundo, 1981 – A Terceira Voz, 1934 - Bichos, 1940 – Contos da Montanha, 1941 – Rua, 1942 - O Senhor Ventura, 1943 – Novos Contos da Montanha, 1944 – Vindima, 1945 – Fogo Preso, 1976.
Peças de Teatro: Terra Firme e Mar, 1941 – O Paraíso, 1949 – Sinfonia, 1947 – Fábula de Fábulas, 1982.
Impressões de Viagens: Portugal, 1950 – Traço de União, 1955.
Diário, 16 volumes entre 1941 e 1993.

Fontes: Wikipedia.org.
Literatura Portuguesa, 29º vol. Da Enciclopédia do Jornal O Público
cvc.instituto-camões.pt



sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

O Boeiro


Boötes (Boo), O Boeiro, é uma constelação bastante compacta, situada entre Canes Venatici e Hércules, tocando também na Ursa Maior e considerada uma das constelações mais antigas conhecida até das primeiras civilizações. A sua alfa Arcturo, (Arktos), de cor alaranjada, é a segunda estrela mais brilhante do hemisfério Norte e a quarta mais brilhante do firmamento e é do seu nome que deriva o termo “Árctico”, que designa toda a região do Pólo Norte.
Na mitologia grega, era filho de Deméter, a deusa da Agricultura, sendo um jovem muito sensato e bondoso, que com os seus cães de caça, Asterion e Charas, apascentava as ovelhas. Comovido por os homens não conseguirem obter alimento da terra, construiu-lhes o arado, para que a cultivassem, ensinando-lhes também os rudimentos da agricultura para que se tornassem auto-suficientes. Como recompensa, e a pedido de sua mãe, os deuses colocaram-no no céu como constelação na posição da Ursa Maior (a quem também chamam O Arado), para a proteger com os seus cães. Era também conhecido como Arctophylax que significa o protector da ursa.
Numa outra versão e por ordem de Juno, a Hera romana, o Boieiro em vez de as proteger vigia-as constantemente com os seus cães, tangendo-as com o cajado que empunha para que estejam constantemente em movimento sem poderem descansar. Arcturo, que significa (guarda do urso) a sua estrela alfa, está sempre de vigia.
Também se diz que foi posto no céu com os seus dois cães para apascentar as estrelas, mantendo a sua rotação.
É citado por Camões no canto III.

Fontes:Nautilus.fis.uc.pt.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Ganímedes

A 11 de Janeiro de 1610, Galileu Galilei descobre a principal lua de Júpiter, que Marius baptizou com o nome de Ganímedes, um dos amores do deus, à semelhança das outras três luas já descobertas.
É a maior lua do sistema solar, e é tão grande, que se não fosse um satélite, seria um planeta maior que Mercúrio ou Plutão.
Na década de 1980 uma equipe de astrónomos indianos e norte-americanos num observatório na Indonésia detectaram uma atmosfera ténue à volta de Ganímedes. Mais recentemente o Telescópio Espacial Hubble, descobriu que essa atmosfera era composta de oxigénio, tal como a atmosfera encontrada em Europa.
Devido ao seu tamanho e características, Ganímedes entra em vários contos de ficção científica, como no livro (Farmer in the Sky) de Robert Heinlein, em que Ganímedes é colonizado por seres humanos. Arthur C. Clarke, em (2061: Odisseia Três), Ganímedes é aquecido pelo novo sol Lúcifer, contém um grande lago equatorial e é o centro da colonização humana no sistema joviano.
Mitologicamente, Ganímedes era um jovem príncipe troiano, extremamente belo, que apascentava as suas ovelhas no Monte Ida. Zeus, ao vê-lo apaixonou-se, e transformando-se numa águia, arrebatou-o para o Olimpo, onde passou a ser o seu copeiro. Essa função pertencia a Hebe, deusa da juventude, filha de Zeus e de Hera, que um dia teve a pouca sorte de cair desastradamente quando servia o néctar da imortalidade aos deuses. Envergonhada pelas suas gargalhadas, recusou-se a fazer esse trabalho, sendo então substituída por Ganímedes. Apesar do ódio de Hera, Zeus concedeu-lhe a imortalidade, colocando-o mais tarde na constelação de Aquário.
Para mitigar um pouco a dor do pai do jovem raptado, Zeus enviou-lhe pelo deus Hermes, dois cavalos tão velozes, que podiam correr sobre a água.
Este mito foi aproveitado por vários artistas desde a Antiguidade, tanto na pintura e na escultura, como na poesia ou na música. O quadro abaixo apresentado foi pintado por Correggio em 1531-32, e encontra-se no Kunsthistorisches Museum, Viena.

Fontes: Wikipedia.org

domingo, 9 de janeiro de 2011

Um mote… Um poema…


MOTE

Batem leve, levemente
Como quem chama por mim
Será chuva? Será gente?
Gente não é certamente
E a chuva não bate assim…
……..

Brrr!!! Que frio!..Já de pijama
E o meu saco de água quente,
Ao resolver-me ir para a cama
Batem leve, levemente…

Que maçada! Quem seria
Que à noite batia assim?
De uma maneira…Eu diria,
Como quem chama por mim.

Fico a meio do caminho
Por mais que a cama me tente,
Pensando em voz alta sozinho:
Será chuva? Será gente?

Espreito num instante breve
Aquele tempo inclemente
Mas o toque era tão leve!
Gente não é certamente…

Cai a neve de mansinho
Quando me deito, por fim…
Parece dizer-me baixinho:
E a chuva não bate assim!

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Inês de Castro - I

A morte de Inês de Castro – Karl Briullov, 1834

“Por que semelhante amor, qual elRei Dom Pedro ouve a Dona Enes, raramente he achado em alguuma pessoa, porem disserom os antiigos que nenhuum he tam verdadeiramente achado, como aquel cuja morte nom tira da memoria o gramde espaço do tempo” – Chronica do Senhor Rei D. Pedro I, Fernão Lopes.
A 7 de Janeiro de 1355, nos Paços de Santa Clara, D. Inês de Castro era executada por”razões de Estado”, a mando de El-Rei D. Afonso IV, depois de ouvidos os seus conselheiros, aproveitando a ausência do Infante D. Pedro, que tinha saído para a caça.
Chegada a Portugal em 1340, no séquito de D. Constança Manuel, e de uma beleza extraordinária, que lhe valeu o apelido de “colo de garça”, a par de uma ridente mocidade, deslumbrou de imediato o herdeiro do trono que por ela se apaixonou. Depois da morte da Infanta D. Constança, mulher do Infante, passaram a viver maritalmente, tendo nascido dessa união quatro filhos, um dos quais faleceu ainda muito menino.
Intrigas políticas e palacianas, levaram a que esta relação de cerca de 15 anos, tivesse um final trágico naquela clara manhã de Janeiro, quando o meirinho-mór, acompanhado de Diogo Lopes Pacheco, Pêro Coelho e Álvaro Gonçalves, conselheiros de D. Afonso IV, mandou o carrasco decapitar Inês, abandonando depois o seu corpo justiçado nas lajes do pátio.
A fúria de D. Pedro, quando ao chegar da caça, encontrou Inês já morta, foi terrível, dando lugar a uma guerra civil que durou meses.
Em 1360, já depois de subir ao trono, D. Pedro consegue a extradição de dois dos culpados da morte de D. Inês, mandando-os executar cruelmente. Declarou depois que tinha casado com ela, sete anos antes, em Bragança, mandando trasladar os restos mortais da sua amada, do Convento de Santa Clara, em Coimbra, para um magnífico túmulo, no Mosteiro de Alcobaça, cuja estátua jacente ostenta uma coroa de rainha.
A história destes trágicos amores resistiu aos séculos. A verdade e a lenda confundem-se no imaginário dos homens das letras da altura, começando pela poesia “As trovas à Morte de Inês de Castro” de Garcia de Resende, que fazem parte do Cancioneiro Geral de 1516, passando por Luís de Camões, e tantos outros, estendendo-se à prosa, ao teatro, cinema, música, pintura e escultura, atravessou fronteiras e conquistou o mundo, transformando-se num Mito de Amor Eterno…
De dois poemas de Tomaz de Figueiredo, extraí estes excertos que supõem uma conversa entre os dois amantes. Podemos imaginá-los, quando depois da trasladação dos restos mortais de Inês, D. Pedro pede que o deixem a sós, junto do túmulo da sua amada:

Ouves, Inês, a minha voz aí,
Nesse leito rendado que te dei?
Inês, porque não falas, não respondes,
Cabeça de oiro e luz, cabeça amada?
Ouves, carne de flor, boca de mel?
Galopei, galopei, a socorrer-te.

Porque é que não chegaste, Pedro, a tempo?
Amado, o tempo nunca volta, nunca!
O tempo é como as nuvens, como as dores,
Que nunca são as mesmas, como as lágrimas.


Fontes: Figueiredo, Tomaz – “Viagens no meu reino”, Obras Completas, excertos dos poemas “Estavas linda Inês” e “Até ao fim do Mundo”.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

PEDIR OS REIS


Ó da casa, nobre gente
Escutareis e ouvireis
Uma cantiga mui nobre
Que se canta pelos Reis.
Quer os deis, quer os não deis
Sempre c’os Anjos sejeis.

Teni, ferrinhos de prata,
Ao toque desta sanfona
Trazemos ovos de prata
Fresquinhos, p’ra vossa dona

O carvalho é folhudo
Já lhe caiu a bolota
Se nos hão-de dar os Reis
Mandem-nos abrir a porta.

Levante-se daí, senhora
Desse seu estrado doirado
Venha-nos dar os Reis Santos
Em louvor de Sant’Iago.

E o senhor dono da casa
Que tem tão bom coração
Levante-se dessa cadeira
Dê-nos lá um salpicão.

Venham-nos cá dar os Reis
Que está um frio de rapar,
O caminho ainda é tão longo
Temos muito para andar.

Depois de receberem:

Esta casa é muito alta
Dobradinha de papel;
Rica lá quem nela mora
Morra quem mal lhe fizer.

Obrigado, obrigado,
Obrigado meus Senhores,
Os senhores donos da casa
São um canteiro de flores.

Se não recebem:

Esta casa não é alta,
Não tem mais que um andar;
Estes barbas de farelos
Não têm nada para nos dar.

Os Reis Magos

O encontro dos Reis Magos, por Pol de Limburg , princípios do sec. XV.
Página de um dos livros do duque de Berry.

A 6 de Janeiro de 353 d.C., celebrava-se pela última vez a festa conjunta do Natal e dos Reis. Calculando que seriam necessários alguns dias para que os Reis Magos pudessem chegar junto do Menino, transferiram então a festa do Natal para 25 de Dezembro (dia da adoração ao Sol), ficando o dia 6 para homenagear os Reis Magos, não especificando porém o seu número, uma vez que no Evangelho de S. Mateus, não havia nenhuma referência nem a números nem a raças. Apenas falava em Magos vindos do Oriente, que tinham oferecido ouro, incenso e mirra. O ouro era um símbolo da realeza, o incenso, o da divindade e espiritualidade, e a mirra, usada nos embalsamentos, o da mortalidade.
Na época das catacumbas figuravam dois a quatro reis, mas na Síria chegaram a ser pintados 12, por este ser o número dos apóstolos e das tribos de Israel. Com o passar do tempo, e a partir dos escritos de Cesário, Bispo de Arles, no sec. VI, o seu número foi fixado em 3, provavelmente porque apenas houve 3 presentes (ouro, incenso e mirra), só se conheciam três continentes na altura (Europa, Ásia e África) esse era também o número da Santíssima Trindade, e só havia 3 idades para o homem (Juventude, maturidade e velhice). Reconhecidos como reis, foram-lhes dados os nomes de Melchior (também chamado de Belchior), Gaspar e Baltasar.
S. Beda, o Venerável (673-735), monge inglês e doutor da Igreja descreve-os assim: “Melchior era velho de setenta anos, de cabelos e barbas brancas, Gaspar era moço de vinte anos, robusto, e Baltasar era mouro, de barba cerrada e com quarenta anos”.
Vinham da Pérsia e Arábia, sendo Melchior o representante da raça europeia, descendente de Jafé, Gaspar, o da raça amarela, descendente de Sem, e Baltasar o da raça africana, descendente de Cam, os três filhos de Noé, que de acordo com o Antigo Testamento deram origem às 3 raças que povoavam o mundo conhecido de então.
Celebra-se também neste dia a Epifania de Jesus, ou seja, a revelação de Jesus Menino ao Mundo, como o Messias, através do reconhecimento e adoração dos Reis Magos, representando estes todos os reis da Terra. Embora nunca tivessem sido declarados santos pela Igreja, o certo é que desde o princípio o culto popular lhes concedeu a santidade, sendo venerados como tal.
Segundo uma lenda medieval, os Magos reencontraram-se novamente na Turquia, 50 anos depois do nascimento de Jesus, onde faleceram. Os seus restos mortais foram encontrados por Santa Helena, mãe do imperador Constantino, sendo transladados para Constantinopla onde permaneceram até 474 d.C. Santo Eustorgio, bispo de Milão, consegue levar as suas urnas para Itália, onde ficam na igreja que tem o seu nome, até que em meados do sec. XII, o imperador Francisco Barba Roxa invade Milão, e apoderando-se das relíquias dos reis Magos, manda-as transportar para Colónia, em 1164, onde ainda hoje se encontram dentro de um relicário de ouro e pedras preciosas, em forma de igreja, na Catedral da cidade. É uma obra de fins do sec. XII feita por Nicolas de Verdun.


Diz-se que quando foram transportadas para Colónia, uma das vacas que puxava o carro foi morta por um lobo. Invocado o auxílio de Santo Eustorgio, logo a fera amansou, colocando-se no lugar do animal morto para que a viagem pudesse continuar.
Com o descobrimento da América, em 1492, que deita por terra a teoria da divisão do mundo em apenas três partes, levanta-se novamente a questão do número dos Reis Magos. Havia agora quatro continentes, mas se fosse acrescentado outro Rei, a autenticidade das três urnas existentes na catedral de Colónia, seria posta em causa.
Dentro do ciclo natalício o tema da Adoração dos Reis Magos é um dos mais aproveitados pelos artistas. Nas primeiras representações conhecidas não havia distinção de raças ou idades, e Melchior aparecia prosternado diante do Menino, à maneira oriental, mas no Ocidente, esta posição foi mais tarde substituída pela genuflexão feudal. Também Jesus, que no tema do Nascimento é apresentado deitado nas palhas, nesta celebração aparece já como uma criança pequena, ao colo de Sua Mãe.
Vasco Fernandes, o grande pintor português quinhentista, mais conhecido por Grão Vasco, pintou um belíssimo quadro sobre este tema que se encontra no Museu do mesmo nome, na cidade de Viseu, onde Baltasar aparece como um índio brasileiro, com um cocar de penas na cabeça, uma lança emplumada, mas vestido à europeia, numa alusão ao descobrimento do Brasil, e à evangelização feita pelos nossos missionários em terras de Vera Cruz.

Em Portugal, ao contrário de outros países, o dia de Reis não é feriado e celebra-se no 1º domingo a seguir ao dia de Ano Novo, seja dia 6 ou não. A Igreja Ortodoxa do Oriente, contudo, continua a celebrar o Nascimento de Jesus neste dia.
O hábito da troca de presentes no dia 6, em vez de ser no Natal, é seguido por vários países como a Espanha, e a Itália, onde as crianças deixam o sapatinho na noite de 5 de Janeiro, com umas ervas para os camelos. No dia seguinte, as ervas desapareceram e em seu lugar estão os presentes. Na Itália, a esta festa chama-se Befana, uma bruxa boa que montada na sua vassoura distribui as prendas.
E assim, um pouco por toda a parte, o encanto da visita dos Reis Magos ao Menino continua a preencher o imaginário de adultos e crianças…


Fontes: wikipedia.org.
Revista Historia Y Vida
História da Arte, edições Alfa

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Quadras Soltas de Natal


Senhores, dêem licença,
Vou acender uma vela,
Para alumiar o Menino
Nunca se viu coisa tão bela!

Do tronco nasceu o ramo
Do ramo nasceu a flor;
Da flor nasceu a Virgem;
Da Virgem, Nosso Senhor.

Três palavras disse a Virgem
Quando nasceu o Menino:
Vinde cá meu bago de ouro
Meu Sacramento divino.

O Menino está dormindo
Nas palhinhas sobre a neve;
Os Anjos lhe estão cantando:
Ditoso de quem vos serve!

Pastor do gado branco,
Não arranques rosmaninho,
Pois é onde a Virgem pura
Vai lavar os cueirinhos.

O Menino está nascido
Lá dentro da lapa fria;
S. José o agasalha
Com o manto de Maria

Cantai, pastores, cantai,
Mas cantai com alegria,
Vinde adorar o Menino,
Filho da Virgem Maria!

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